A relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU)* para a Eliminação da Discriminação contra Pessoas Afetadas pela Hanseníase elogiou recentemente os avanços legislativos no Brasil para proteger e promover os direitos humanos das crianças separadas dos pais afetados pela hanseníase.
Beatriz Galarza parabenizou “todos os defensores dos direitos humanos, incluindo o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase, o Morhan, por esta conquista”.
Política de segregação
O ex-coordenador nacional do Morhan, Artur Custódio, conversou com a ONU News e destacou que a política de segregação ligada à doença persistiu mesmo depois do avanço da ciência e o desenvolvimento da cura para a hanseníase. Ele explicou a importância e o alcance da nova lei.
“No caso do Brasil e vários outros países, as pessoas podiam ter filhos, mas os filhos eram retirados delas. E não se sabe o paradeiro de muitos, é preciso fazer banco genético. Então, o presidente Lula, em 2007, fez, por medida provisória, uma indenização para as pessoas afetadas pela hanseníase que ficaram isoladas em colônias. E agora, em 2023, cumpre uma segunda etapa, dando uma indenização, uma reparação pelo crime de Estado também para os filhos que foram tirados dos pais e por outro lado complementando a lei do passado e dando a reparação também para aquelas pessoas que foram isoladas na floresta Amazônica e que não tinham sido reconhecidas porque não ficaram em hospitais”, ressaltou.
Medidas de reparação
Para Custódio, este é “um importante passo da justiça de transição”. Porém, o ativista defendeu que outros passos são ainda necessários, como a melhoria do acesso à saúde e à assistência social, bem como a preservação da memória.
Entre 1923 e 1986, cerca de 16 mil crianças foram separadas dos pais que sofriam de hanseníase e enviadas para abrigos, sob a política de segregação forçada vigente no Brasil na época.
Em 24 de novembro de 2023, em linha com as recomendações anteriores das Nações Unidas, o presidente do Brasil assinou uma lei que estipula que a bolsa mensal paga às pessoas com hanseníase não pode ser inferior ao salário-mínimo.
A nova legislação determina ainda que as crianças que foram separadas dos pais também podem receber o auxílio como medida de reparação.
Luta de décadas
A relatora especial incentivou o governo brasileiro a “implementar esta lei com os recursos e estruturas necessárias e a garantir que os casos sejam examinados e decididos pela comissão interministerial de forma rápida e eficaz”.
Estas crianças separadas têm lutado por reparações por parte do Estado e apresentaram vários processos em tribunais estaduais ao longo da última década.
Segundo Beatriz Galarza, “o Brasil não foi exceção”, ressaltando que crianças também foram separadas dos pais e cuidadores e excluídas da sociedade por causa da hanseníase em muitos outros países.
Exemplo a ser seguido
Como resultado, muitas pessoas que sofreram estas violações não têm acesso a um nível de vida adequado e à autonomia econômica, e muitas enfrentam “deficiências psicossociais que dificultam a sua inclusão social”.
A especialista da ONU instou outros Estados a seguirem o exemplo do Brasil e fornecerem com urgência reparações simbólicas e materiais e o apoio necessário às pessoas que, quando crianças, foram separadas de seus pais afetados pela hanseníase e segregadas da sociedade.
*Os relatores especiais da ONU trabalham de forma voluntária e não recebem salário pelo seu trabalho.
- Saiba mais em: Reparação para famílias separadas pela hanseníase no século passado é instituída em lei
Fonte: ONU News